colunista do impresso

O rei está nu

style="width: 100%;" data-filename="retriever">

As comemorações pelos 80 anos do Pelé foram marcadas por reverências ao rei. Comemorações e reverências estas que foram além do futebol. O talento com a bola é inegável - dribles desconcertantes, autêntico camisa 10, cérebro dos times em que jogava, enfim inúmeras qualificações. Um atleta diferenciado, único. Raciocínio rápido. Chutes certeiros. Gols espetaculares, antológicos. O maior jogador de todos os tempos.

Diante de tantas homenagens e referências não apenas ao atleta mas, à pessoa espetacular, ao exemplo de homem, me pus a pensar. Uma pergunta logo me veio à mente: Será que se Pelé iniciasse a carreira nos tempos atuais, ele seria reconhecido como rei? Me reporto à filha Sandra e à postura machista assumida por ele próprio.

Em uma reportagem, Milton Neves relata que Pelé, quando procurado sobre a existência da filha, questionou, pois já haviam outras três ou quatro pessoas que também pleitearam reconhecimento de paternidade. Ele criticou o oportunismo dos pretendentes e afirmou:

- Nenhum vingou!

Ainda assim, pediu para ver uma foto de Sandra. A semelhança era evidente. Pelé se referiu ao namoro com a mãe da moça como fugaz e, afirmou que "poderia ser possível, pois naquele tempo namorávamos muito".

Ela nasceu de um relacionamento com a empregada doméstica Anísia. A luta de Sandra Regina Machado foi iniciada em 1991. Ela tinha 27 anos. Em 1992, um exame de DNA confirmou que ela era filha do rei do futebol. O reconhecimento da paternidade ocorreu quando ela já possuía dois filhos. Em 2006, Sandra morreu de câncer. Pelé não compareceu ao velório. Em entrevista ao portal G1, questionado sobre a filha e o distanciamento, ele respondeu:

- Para mim, biologicamente, ela até pode ser minha filha, mas na parte sentimental não posso me preocupar com esta pessoa porque não a conheço.

Em outra oportunidade, Milton Neves intermediou o encontro de Pelé com os netos. O desagrado foi evidente, conta ele:

- Pelé olhava para mim com raiva e ódio como se olhasse para certos "zagueiros cavalos" que o caçavam".

Em 2002, Pelé reconheceu a paternidade de Flávia, fruto de mais uma relação casual. O reconhecimento de filhas ignoradas atesta o desrespeito e a sua atitude machista ante as mulheres. Nítida postura de dominação e poder. A condição de atleta bem-sucedido representava uma porta aberta para tratar as mulheres como objeto, descartando-as, assim que outra aventura aparecesse, sem preocupação com as consequências.

Culpa e dor misturaram-se ao sentimento de arrependimento de mães e de filhas invisíveis, como se o caminho fosse de via única. Os movimentos feministas crescem e fortalecem as mulheres contra a submissão e ao abuso. Nunca coube e, nos tempos atuais muito menos, cabem homens com postura machista. Pelé é um rei nu. Majestade não se reconhece apenas pelo talento. Majestade é postura ante a vida, às mulheres e a todos com respeito, justiça e igualdade.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

PLURAL: os textos de Marcio Felipe Medeiros e Rogério Koff Anterior

PLURAL: os textos de Marcio Felipe Medeiros e Rogério Koff

Quem pode nos ajudar? Próximo

Quem pode nos ajudar?

Colunistas do Impresso